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Quem anda pela cabeça dos outros é piolho




Final de janeiro e início de fevereiro, não somente os filhos, mas também os pais começam a se preparar para mais um ano letivo. Hoje, uma das preocupações dos pais é o material escolar, que todo ano fica mais caro. Mas houve um tempo em que o que deixava os pais de cabelo em pé de verdade era o fato de que ao voltarem às aulas, voltariam também os piolhos na cabeça dos filhos. Para acabar com o coça-coça, as mães passavam de tudo no cabelo, mas o método mais eficaz, e também mais dolorido e chato, ainda era passar aquele pente fino nos cabelos. Igualmente terrível para uma criança era a “catação” de lêndeas e piolhos por horas intermináveis, quando poderia estar brincando.

Tem um ditado popular que diz: “Quem anda pela cabeça dos outros é piolho”. Visto que a família exerce um papel primordial na educação, que abrange princípios de vida e de ética, disciplina e orientação espiritual, quando os filhos passam a exibir valores diferentes daqueles que aprendeu em casa, certamente estão indo pela cabeça de outros, estão se comportando como piolho.

O conselho do rei Salomão era: “Meu filho, ouça a instrução de teu pai, não desprezes os ensinamentos de tua mãe, pois são como um enfeite para a tua cabeça e um adorno para o teu pescoço. Se as más companhias te quiserem seduzir, não lhes dês ouvidos, meu filho” (Provérbios 1.8-10). Há filhos, no entanto, que ainda não conseguem fazer este discernimento, pois não foram ensinados a exercer sua autonomia longe dos pais, dentro de um parâmetro emocional e cognitivo adquirido no seio familiar. Assim como as crianças estão mais vulneráveis aos piolhos, também a personalidade imatura de muitos filhos os tornam mais suscetíveis à sedução das más companhias. A omissão dos pais na correção do caráter e na formação de cidadãos íntegros, certamente trará transtornos à família e, mais tarde, à sociedade.

O saudoso Içami Tiba, psiquiatra e educador, autor de Quem Ama, Educa!, também comparava com o piolho aqueles comportamentos nocivos que o filho traz para casa e que os pais não aceitam, exatamente por não fazerem parte da educação familiar. Eles são transmitidos pelo convívio com as más companhias, infestam a mente, sugam a inteligência emocional e se os pais não passarem um pente fino constante para eliminá-lo do convívio familiar e social, vão continuar se proliferando. Assim como a triste tarefa da catação de piolhos deu origem ao nosso prazeroso “cafuné”, um pente fino familiar, que seleciona o que é bom e o que não é, também gera a felicidade e a alegria de viver com qualidade.

A educação, o ensino de valores e a correção ajudarão nossos jovens “a viver com disciplina e sensatez, fazendo o que é justo, direito e correto” (Provérbios 1.3). Se hoje as famílias combaterem os terríveis piolhos de natureza comportamental, no futuro a corrupção talvez não domine os noticiários e a preocupação em construir mais e mais presídios não domine a agenda de uma boa governança.

Publicado no Jornal O Guarani, nº 2493 - 27/01 a 02/02/2017 (Itararé, SP)

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