O Prof. Nilson José Machado, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, diz que “a sensação de conforto resultante de estarmos de acordo com a maioria é simetricamente comparável ao desconforto associado à defesa de posições minoritárias” e que “a influência da maioria nas decisões pessoais parece muito mais emocional do que lógica” (Educação: cidadania, projetos e valores, pág. 143). Nestes tempos de incertezas, discórdias e extremismo nas esferas políticas e sociais, quantas vezes nos deixamos conduzir por uma multidão passional sem a devida reflexão?
A Semana Santa, que tem seu ponto alto na celebração da Páscoa de nosso Senhor, tem início no Domingo de Ramos, recordando a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém. Uma multidão recebeu Jesus como um rei, aclamando “Hosana ao Filho de Davi!” “Bendito é o que vem em nome do Senhor!” “Hosana nas alturas”. A multidão que acolheu Jesus com grande festividade o condenou à morte no fim de semana. A psicologia das massas pode nos fornecer indícios deste comportamento antagônico: em meio à multidão, uma pessoa pode ser encorajada a fazer coisas que não faria se estivesse só. Neste sentido, o Domingo de Ramos pode nos ensinar duas coisas. Primeiro, o comportamento da massa nem sempre é completamente irracional como imaginamos e, de fato, a multidão de Jerusalém estava decepcionada com aquele rei tão humilde e tão vagaroso nas reformas que esperavam. O segundo ensinamento é que a maioria pode estar errada e, de fato, condenaram um inocente à morte.
A qual multidão iremos nos misturar ao longo desta Semana Santa? Vamos com a multidão das redes sociais, que nos encoraja a destilar o ódio, a intolerância e a matar fisicamente e emocionalmente muitos inocentes? Estaremos com a multidão que irão às celebrações da Semana Santa cumprir o hábito ou por desencargo de consciência? Vamos nos misturar à multidão sem compaixão com os sofrimentos e mortes cotidianos que irá se emocionar com a encenação da Paixão de Cristo?
Para estar na multidão com propósitos definidos é preciso, em primeiro lugar, estar só e encontrar-se consigo mesmo. Dietrich Bonhoeffer, pastor e mártir, escreveu: “A pessoa que não suporta a solidão deve tomar cuidado com a comunhão. Ela só causará dano a si mesma e a comunhão. Sozinho estavas diante de Deus quando ele te chamou; sozinho tiveste que seguir o chamado; sozinho tiveste que tomar sobre ti a cruz, lutar e orar; sozinho morrerás e prestarás contas a Deus. Não podes fugir de ti mesmo, pois o próprio Deus te separou.” (Vida em Comunhão, pág. 58)
O poema latino medieval “Salve caput cruentatum”, que é o hino cristão tradicional para este período, diz assim:
Momentos de alegria
e grande bem-estar,
ó meu divino Guia,
eu sinto ao meditar
no que por mim fizeste.
A fim de me redimir
a própria vida deste.
É bom a ti seguir.
Meditar pode nos libertar da influência da maioria e nos proporcionar a dádiva de celebrar a Semana Santa com sinceridade e verdade.
Uma abençoada Semana Santa!
Publicado no Jornal O Guarani, nº 2502 – 07 a 13/04/2017 (Itararé, SP)
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